Pro mundo em decomposição, escrevo como quem manda cartas de amor

Passei mais de duas horas no telefone com uma amiga ontem, e compartilhei com ela coisas que eu nunca tinha dividido com ninguém, nem com minha psicóloga. Depois que desligamos, além de pensar muito sobre o que a gente tinha conversado, me veio uma retrospectiva e eu comecei a refletir no papel que as amizades tiveram e têm na minha história.
Existe uma expressão que diz que bons amigos são poucos, ou que podem ser contados nos dedos de uma mão. Eu me sinto como uma exceção a essa regra. Sempre fui uma pessoa de muitos amigos e, apesar de fazer parte de certos grupinhos, principalmente na infância e na adolescência, sempre tentei transitar por diferentes “tribos”. Como consequência, ainda hoje tenho amigos de infância (que literalmente estão comigo desde que nascemos), da época de escola, da faculdade e de diferentes trabalhos.
É curioso que, ao longo da vida, tive pouquíssimas decepções relacionadas a amizade; costumo ter o dedo assertivo ao escolher quem vai caminhar ao meu lado. Muito disso se deve ao fato de eu gostar de ler as pessoas (e, sem falsa modéstia, ser geralmente boa nisso) desde o primeiro contato. A outra parcela eu dedico à minha personalidade sagitariana, que não perde muito tempo com quem não vale a pena e não tem frescura se precisar jogar uma real.
Todo esse rodeio pra dizer que: MEUS AMIGOS ME SALVAM! A pandemia me trouxe pra um lugar de muitas crises internas (potencializadas por mazelas de outros e fatores externos também), muitos medos, muitas culpas. Se eu morresse hoje, não morreria feliz. Não cheguei num estado de plenitude de sentir que estou vivendo minha melhor vida, fazendo o que mais amo, vivendo as experiências com as quais sonho – o que não quer dizer que eu não seja uma pessoa muito feliz. Mas se tem uma coisa com a qual eu partiria tranquila desse mundo, é a certeza de que eu tive as pessoas certas remando comigo nesse barco.
Eu me sinto amada, admirada, acolhida, inspirada e, quando necessário, carregada no colo pelos meus amigos. Com alguns, eu converso todos os dias. Com outros, uma vez por mês ou até menos. Mas, mesmo de longe, eu sei que tenho pra onde correr, e faço o que posso pra que eles saibam que aqui também têm um cais.
Me deu vontade de escrever sobre isso porque a gente tá atravessando um momento muito triste, de todos os ângulos. O egocentrismo, a falta de humanidade, o ódio, o racismo, a desinformação e a soberba – que, não nos enganemos, sempre estiveram aqui – parecem ter se escancarado de uma forma que nos obrigou a ver a feiura do mundo e das pessoas. Nos obrigou a olhar pra dentro e ver as nossas próprias fissuras. A olhar pra pessoas que amamos e perceber que algumas delas não estão nem aí, ou não estão dispostas a fazer nada além de postar hashtag nas redes sociais.
Num momento como esse, eu considero fundamental analisar as nossas amizades. Analisar se as pessoas que a gente escolheu pra estarem ao nosso lado estão alinhadas com os nossos valores, se estamos olhando na mesma direção. A humanidade como um todo está fragilizada, e é hora de nos fortalecermos, de adotarmos uma postura mais ativa diante do que precisa ser mudado. Então escolha bem quem você vai levar nessa jornada. Você não tem que ter amigos que sejam iguais a você em tudo, mas se você não admira uma pessoa a quem chama de amigo, talvez eu tenha um recado pra você.
Aos meus amigos, obrigada, muito obrigada. No meu último aniversário, meu tio e padrinho, alguém que me conhece profundamente, usou as seguintes palavras pra me descrever: “quem quiser conhecer a Raíra, é só olhar pros amigos dela. Essa é a Raíra”. É isso. Não ando só.

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